O Real Digital está previsto para ser lançado em 2024, e sua chegada impactará o sistema financeiro brasileiro. Uma das mudanças está relacionada ao ambiente de tokenização, que pode ser impulsionado. Ao Cointelegraph Brasil, porta-vozes de tokenizadoras brasileiras contam como a relação entre ativos tokenizados e a versão digital do real podem interagir.
Alavanca da tokenização
O lançamento do Real Digital, moeda digital emitida pelo banco central (CBDC, na sigla em inglês), está previsto para o fim de 2024. As mudanças propostas pelo projeto incluem a possibilidade de bancos comerciais criarem stablecoins lastreadas na CBDC, integrações com o ambiente de finanças descentralizadas e praticidade nas negociações do atacado.
Em um estudo publicado em 2022, a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA) avalia que o Real Digital é uma das alavancas da tokenização. Daniel Coquieri, CEO da Liqi Digital Assets, diz que “não tem dúvidas” de que a versão digital do real pode realmente impulsionar a tokenização no Brasil.
Coquieri afirma que o Real Digital é uma moeda de liquidação em uma nova infraestrutura para o mercado financeiros e de capitais, e essa nova infraestrutura é a tecnologia blockchain.
“Por exemplo, é possível programar uma estrutura de FIDC, que é um fundo de investimento em direitos creditórios, inteira em blockchain. Toda a operação, como compra de ativos, liquidação de ativos, posição do fundo e cotas sênior, pode ser replicada e programada em blockchain. Mas ainda é necessária uma moeda de liquidação confiável”, diz o CEO da Liqi.
As operações do mercado de capitais, diz Coquieri, são firmadas, geralmente, entre ativos e dinheiro. Por isso, é necessário que a parte do “dinheiro” esteja inserida nesta mesma estrutura, para que sua eficiência não seja perdida.
Fúlvio Xavier, diretor de projetos especiais do Mercado Bitcoin, também acredita que a CBDC facilita o ambiente regulado e a criação de modelos tokenizados de títulos públicos. “O Real Digital, teoricamente, vai facilitar o pagamento e trocas entre os participantes do sistema e um novo meio de consolidação e integração, já que muitas transações poderão ocorrer diretamente na rede do Banco Central”, diz Xavier.
Lidando com o risco de liquidação
O Real Digital também resolve o “risco de liquidação” dos títulos públicos tokenizados, comenta Carlos Ratto, CEO da Vórtx QR Tokenizadora. Ele afirma que, nos mercados onde não existe uma contraparte central garantidora para liquidação de títulos, como os mercados de títulos públicos e privados, há o risco do comprador não receber o título no final do dia, após a liquidação.
Lidar com esse risco, salienta Ratto, gera custos e limitações nas negociações. Em um ambiente tokenizado, porém, o Real Digital resolveria este problema. “Num mesmo comando, será feita a transferência do ativo, o débito na conta ‘Real Tokenizado’ do banco do comprador, a transferência em Real Digital para o banco do vendedor e o crédito em Real Tokenizado na conta do vendedor do ativo”, afirma o CEO da Vórtx QR.
Na prática, a relação entre Real Digital e tokenização possibilita a criação de um mercado de capitais com liquidação online, em tempo real, e sem risco de liquidação, operando a qualquer momento, em qualquer dia da semana, destaca Ratto. Sobre o uso do Pix , sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central, sanar o problema, ele diz que não há possibilidade de liquidação instantânea.
“Apesar de podermos transferir dinheiro a qualquer hora do dia para outra pessoa via Pix, não podemos comprar um título público, título privado, ações ou cotas de fundo em qualquer horário. Você pode até fazer uma compra pagando via Pix à noite ou de madrugada, mas o dinheiro que está aplicado em um Fundo de Investimento para cobrir a sua conta só pode ser resgatado no dia seguinte.”
E as stablecoins?
As stablecoins são criptomoedas cujo valor é pareado a outro ativo, como dólar, euro e real. Elas não são, porém, garantidas pelo estado. Daniel Coquieri, da Liqi, salienta que existem riscos jurídicos, riscos de tecnologia e riscos de má gestão da tesouraria da emissora da stablecoin.
“É comum vermos em stablecoins que já existem no mercado cripto a perda da paridade com o ativo ao qual estão vinculadas. Com o Real Digital, falamos de mercado regulado, com o Banco Central controlando e dando garantias para os participantes do mercado que a CBDC tem lastro”, diz Coquieri.
No mesmo sentido comenta Carlos Ratto, da Vórtx QR, ao dizer que o Real Digital tam garantia do regulador. “A transferência dessa moeda será feita exclusivamente por instituições financeiras que necessitam depositar reais nas suas contas reserva. Ou seja, a liquidação não passa por contas de terceiros. É diretamente entre a conta do comprador e a do vendedor, contas essas de suas respectivas titularidades”, afirma Ratto.
O projeto da CBDC brasileira, no entanto, prevê a criação do Real Tokenizado. Trata-se de uma stablecoin emitida por um banco comercial, sob a autorização do Banco Central, com lastro no Real Digital.
Nesse caso, Fúlvio Xavier, do Mercado Bitcoin, é possível que o Real Tokenizado seja utilizado como moeda de liquidez em um ambiente de tokenização. “Certamente, com o amadurecimento da rede e do Real Digital, as instituições farão mais interações com stablecoins dentro dos mais variados casos de uso”, conclui Xavier.
Cointelegraph
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